quinta-feira, março 15, 2007

Pornostalgia

"O único cinema real é o cinema pornográfico."
Jean-Luc Godard





Não estou certo da idade, mas devia ser por volta dos dez. Fui à casa de um vizinho jogar War, Super Trunfo ou algum outro jogo que já não lembro mais. O que me lembro bem é que chegaram alguns outros amigos deste meu amigo e colocaram um filme pra assistir na sala (nós jogávamos no quarto). Quando lá cheguei, atraído pelo inconfundível som de gemidos femininos, vi na TV aquela mulher de quatro, burrão pra cima, e o cara fazendo o seu trabalho, por trás. Acreditem ou não, estavam ambos dentro de uma piscina cheia de quadradinhos de isopor, algo que nunca mais voltei a ver, fosse em filme ou na vida real.

Era o primeiro filme pornô que assistia na vida. De lá pra cá, vários outros se seguiram e, durante as décadas que se passaram, muita coisa mudou no universo daquilo que carinhosamente chamávamos de “filmes de sacanagem”.

Acredita-se que o primeiro filme pornográfico foi La Bonne Auberge. Rodado na Paris de 1908, o filme mostrava prostitutas interpretando a si mesmas em cenas de sexo explícito. Mas foi somente na década de 70 que a coisa começou a crescer (aviso logo que vai ser impossível evitar os trocadilhos neste texto).

O grande responsável pela ereção da porno-indústria foi Gerard Damiano, que dirigiu, entre 1972 e 1973, os dois maiores clássicos do estilo: Garganta Profunda (Deep Throat) e O Diabo na Carne de Miss Jones (The Devil In Miss Jones). No Wikipedia consta que Garganta foi gravado em seis dias e teve o custo irrisório de 24 mil dólares, financiados pela família mafiosa Peraino. Arrecadou cerca de 20 milhões de dólares nos EUA e por volta de 600 milhões no mundo inteiro, tornando-se o maior sucesso do gênero pornô de todos os tempos.

Mas o que importa aqui é dizer que estes filmes tinham histórias, e histórias, em minha opinião, até interessantes. Miss Jones, por exemplo, foi uma mulher que morreu virgem e, por conta disso, iria arder no inferno (o que me parece muito justo). Mas ela consegue a permissão do Diabo para voltar à Terra e experimentar tudo aquilo que havia renegado em vida - incluindo bananas e animais.


Linda, de Deep Throat, descobre que não atinge o orgasmo porque tem o clitóris na garganta, o que leva a moça a enveredar pelo que os antropólogos costumam chamar de "cultura oral". É claro que ambas são histórias inverossímeis, diria até viajantes, mas servem de pretexto pra toda a putaria que daí se segue.

Nos famigerados anos 80, entretanto, os diretores pornôs começam a abandonar roteiros mirabolantes e partir pro vamos-ver da maneira mais direta possível, como no caso da moça com quadradinhos de isopor grudados na bunda, que vi quando moleque. Dois amigos perspicazes, Diogo Lyra e Bruno Cardoso, em um rompante de análise sobre a história do cinema pornô, batizaram essa fase anos 80 como a dos filmes fast-food – no que estavam cobertos de razão.

Mas aí chegaram os anos 90, os anos 00 e, com o desenvolvimento da internet, tudo mudou mais uma vez. Os filmes começam a dar lugar a cenas de poucos minutos, às vezes segundos, numa concepção funcionalista que crê que a duração dos filmes não precisa ultrapassar o tempo da punheta mais afobada. O erotismo e a insinuação caem por terra de maneira broxante, e é aí que começo a sentir saudades de um tempo que não vivi: o dos filmes de Gerard Damiano.

Existem várias outras questões ligadas a isso, como a proliferação, também astutamente detectada por Cardoso e Lyra, de vídeos amadores que seguem tendência similar a dos reality show que pululam na TV atual. Mas esses assuntos eu deixo pro espaço dos comentários, certo que estou do quanto outros olhares podem contribuir para fazer este tópico crescer - principalmente se forem olhares voyeurs.


...


Para os pornostálgicos, algumas dicas do que assistir:

1. Os dois filmes citados do Gerard Damiano, claro. Ele usava, como pseudônimo, Jerry Gerard.

2. Filmes que tratam das mudanças ocorridas na porno-indústria, como Boogie Nights e O Pornógrafo. Este último é um pouco chato, mas tem a vantagem de conter uma ceninha de sexo explícito.

3. Os Idiotas, de Lars Von Trier, que está aqui não porque é um filme excelente (o que de fato é), mas porque rola um bacanal no meio da história.

4. Qualquer filme brasileiro dos anos 80 com atrizes como Vera Fischer e Lucélia Santos, ou com Nuno Leal Maia. Também entra nessa lista o clássico Amor Estranho Amor, estrelando a eterna rainha dos baixinhos - como vocês podem atestar na foto abaixo.




Já a dica do que não assistir vai pra Brown Bunny, de Vincent Gallo. É o filme mais arrastado que já vi, motivado por um boquete nos últimos minutos que pode ser visto em qualquer Pornotube da vida.

E, para os de estômago fraco, Saló, os 120 Dias de Sodoma (Saló – Le 120 Giornate Di Sodoma) também não é recomendado. Neste filme, que transpõe as lições de "Os 120 Dias de Sodoma", do Marquês de Sade, para os últimos dias da ditadura fascista na Itália, sexo não é associado com prazer, mas sim com sangue, fezes e esperma. Talvez isto explique porque seu diretor, o italiano Pier Paolo Pasolini, foi brutalmente assassinado 20 dias antes do lançamento da película.





...

13 comentários:

Anônimo disse...

faltou mencionar o Ron Jeremy...

Madame S. disse...

reprodução da reprodução
*duplo sentido

Anônimo disse...

I have no idea how porn is defined in Brazil(please inform me Cascavarrias) but the US Supreme Court defined pornography as "... any image made for the express purpose of conjuring up sexual thoughts...." Well shit, that could be just about anything couldn't it?
Cinema pornography has been around since the dawn of motion picture making. "Stag Films" were what they were called in the old days.
The 60's and 70's were an era when everything was questioned and explored. So why not with cinema porn? The US Supreme Court left a massive legal loop-hole open after all...
The whole thing thus began with the first "X" rated movie to come out of hollywood, "Midnight Cowboy" with John Voight and Dustin Hoffman. It's about an incredibly naive country boy who goes to New York City to become a male prostitute/gigolo. Nowadays it's consider a classic but the subject of male prostitiution was wayyyyyyyyyyy too controversial for 1969 america. Thus the "X" rating was born.
"Midnight Cowboy" and the new "X" rating made films like "Deep Throat" and "Behind the Green Door" possible. So for a few years cinematic pornography was actually accepted into mainstream american life. These were the good old days before Reagan, AIDS and the VCR.
Yes Arthur, you're right when you say it all became like fast food during the 80's. Today with web-porn it's more like the microwave 2 minute borrito. It's all the same...all cliche and a lot of people even fuck like they do in todays porn. BANG BANG BANG BANG oooooohhhh aaaahhhhhh BANG BANG BANG BANG...yeah my bitch! fuck yeah! BANG BANG BANG BANG....
There is a glimmer of hope though. Thanx to the world wide web and the digital camera, the web amatuer porn industry is growing. Now just about anyone can make porn anyway they like and have it instantly posted on the internet. I must confess I have become a big fan of this new "cottage industry"!!!
Visionary Directors like Gerard Damiano despite all the cocaine consumption, gun running and mafia dealings, tried to make the genre a respectable art. Who knows where it could have led? Sex made into an artistic catharsis? I'd love to see someone attempt THAT once again! The technology and public demand is definitely here...

Anônimo disse...

Ausências sentidas (ui!):
- Série Taboo, com o piramidal John Holmes - pra quem não se lembra, 38 cm de rola;
- Ele, o garanhão italiano: Rocco Sifredi. Pra quem curte pornô com historinha, os filmes dele são imbatíveis. E nada daquela estética estadunindense de pelos raspados (o que é essa moda Buttman de mostrar homem de saco depilado?), enormes unhas rosa-choque e silicone pra todos os lados;
- Os filmes da diretora francesa Laetitia, uma louraça putona que percorre a Europa realizando as fantasias sexuais daqueles que escrevem para ela. Na minha modesta opinião, ninguém faz pornô como ela.

Mas...
Se é para fomentar gargalhadas, seguem alguns clássicos que resumem o fino do tosco em matéria de x-rated:

- Fuc-fuc à brasileira: do início dos anos 80, é protagonizado por Chumbinho, uma não preto que interpreta um alienígena surdo-mudo;
- Pocahontas: versão da Brasileirinhas para o mito de fundação daquele estranho pedaço de terra ao norte do continente americano. Destaque para a impecável trilha-sonora - ao fundo, em tom grave, o refrão: u-ru-cum, u-ru-cum;
- Qualquer pornô português. Até o final do século passado, pelo menos, não havia filme profissional em terras lusas. Tudinho amador. Imperdíveis!

É isso.

Beijo.

Anônimo disse...

Quer dizer, ANÃO preto

Henrique Santos Pakkatto disse...

Meus conhecimentos de pornô não serão divulgados aqui porque eu, como cavalheiro (não Jedi), não posso expor aqui as mulheres que passaram pela minha mão.

Eduardo Goldenberg disse...

Arthur: faltou, meu caro, o maior de todos, com a maior de todas, a deusa-mulata, Adele Fátima, no impagável "As Histórias que as Nossas Babás não Contavam".

Eu tenho em DVD.

Raridade.

Anônimo disse...

Nós, os imigrantes ilegais que compõe a equipe do Fundo de Quintal Literário, agradecemos a menção feita ao honorável Sr. Lyra. Por telefone ele nos pediu para comunicar que, inclusive, tem trabalhado em um artigo sobre o tema, mas ainda não conseguiu terminar seu "trabalho de campo".
Cordialmente,
Son Soh
Lao Chi Chi
Gil Evans
(Equipe Provisória do Fundo de Quintal Literário).

4rthur disse...

Agradeço as preciosas contribuições de todos. Minha lista de próximos filmes só faz crescer - o que, em se tratando de cinema pornô, é sempre desejável.

Anão preto interpretando alienígena surdo-mudo? Nem fazendo muita força eu conseguiria imaginar o que se passa nessa película.

Pakkato, o que vc quis dizer com "eu como cavalheiro"?

Edu, agora que você revelou que tem o DVD da Adele Fátima (sua musa inspiradora desde as páginas da revista Amiga, que eu sei), estou tentado a te entregar uma mídia pra que vc grave o filme pra mim. Perdi todas as Sessões das Dez em que o SBT exibiu tal película!

Eduardo Goldenberg disse...

Será um prazer rigorosamente inenarrável. O mundo PRECISA conhecer Adele atuando naquela película que não teve a carreira que mereceu.

Anônimo disse...

ah sim, pegando carona nas indicações mais que pertinentes do Honorável Sr. Edu do Boteco (a Sardinha 88 é uma delícia mesmo), indico o filme "Alugam-se Moças 2", com a Rita Cadilac e outras clássicas. O filme é hard e apresenta, inclusive, cenas de sexo explícito!!!!

Anônimo disse...

Acho q alguns de vcs cometeram um erro primário, mas, infelizmente, um tanto corriqueiro...Pornô é uma coisa, tem o tal do sexo explícito como recurso narrativo principal, enquanto os filmes q apenas mostram algumas cenas com seios, bundas e xotas, poderiam apenas ser classificados como eróticos...Estão nesse grupo filmes maravilhosos como o da Adele Fátima(a gloriosa Clara das Neves), o da Xuxa (q na verdade nem erótico é... mas deixa pra lá), e, ausência sentida, a série cult Emanuelle (o original, francês, com a Sylvia Krystel, não o remake americano de merda).
Espero q minha perspicácia possa ajudar na discussão, realmente de interesse um tanto relevante para o universo mundial masculino (as mulheres ainda têm um preconceito primitivo contra essa forma de arte conceitual - minha pequena, por exemplo, afirma q não tem qquer preconceito, só acha escroto e uma merda.

Voltarei a escrever sobre isso, mas antes preciso lembrar de alguém q foi negligenciado por todos e merece seu lugar indiscutível na galeria do cinema XXX (além do valor sentimental pra mim, por estrelar o meu primeiro filme assistido - meu equivalente à piscina de isopor): a gloriosa senadora Ilona Stalin, vulgarmente conhecida como Cicciolinna...

Com essa lembrança, me despeço parcialmente, afinal esse assunto todo me lembrou de uma coisinha q tinha pra fazer...

Um abraço (depois desse debate, não ousaria apertar a mão de nenhum de vcs!)

Anônimo disse...

PS: O filme se chamava: "Cicciolinna, seus homens, seus animais"... como vcs podem imaginar, essa primeira película da vida continha pesadas cenas explícitas de zoofilia... foi um tanto chocante pra mim, mas achei maneiro de assistir... criança é foda!!!