segunda-feira, setembro 10, 2007

Cinema, música, ecologia e haribolzice


Foram duas viagens diferentes realizadas neste último feriadão, sendo uma a trabalho e outra a passeio. A viagem a trabalho consistiu em uma ida à Conservatória (lugar sobre o qual já falei aqui) em razão da abertura do primeiro festival Cine Música. Como Conservatória possui uma identidade fortemente musical, este evento de cinema teve como foco curtas e filmes ligados a música, como Chorinhos e Chorões, O Jaqueirão do Zeca, Vinicius, Coisa Mais Linda, o ainda em cartaz Brasileirinho e muitos outros, além de premiações e homenagens aos profissionais que se destacaram nas áreas de sonorização, mixagem de áudio e técnicas afins.



O grande chamariz do evento é o Cine Centímetro, construído pelo cinéfilo Ivo Raposo em Conservatória a partir dos objetos que obteve do Metro Tijuca, antigo cinema de rua demolido em 1978. Eu me lembro bem de quando comecei a ir ao cinema sozinho na mesma Tijuca, que no final dos anos 80 ainda contava com 7 cinemas ao redor da praça Saens Peña, sendo a verdadeira cinelândia carioca. Para os que vivem esta mesma nostalgia, é um verdadeiro deleite poder entrar, em pleno século XXI, numa réplica perfeita de um cinema de três décadas atrás.


Findos os compromissos profissionais (que também incluíram beber uísque e experimentar canapés cujos nomes não saberia pronunciar), me dirigi ao município de Silva Jardim, do outro lado do estado, para um evento de características bastante diversas. Tratava-se da segunda edição do Festival Experimental Eletrorgânico, cuja tônica era a realização de shows, performances artísticas e manifestações culturais regionais em “um ambiente projetado com princípios da permacultura e da bioconstrução, estimulando desde o primeiro momento atroca e a reciprocidade com a comunidade local” (conforme o texto oficial do evento).





A filosofia “haribol” que sustenta os ideais dos organizadores do festival é bastante radical nos seus preceitos eco-sustentáveis: todos os participantes acampam no vasto terreno, tomando banho e escovando os dentes no rio, com cuidado para não deixar sabonetes, bronzeadores, shampoos, pastas de dente ou quaisquer outros produtos químicos entrarem em contato com a água. O banheiro chama-se fossa, e trata-se de um buraco no chão onde as pessoas fazem suas necessidades de cócoras, jogando serragem em cima ao fim dos “trabalhos”. A cozinha só serve alimentos vindos direto da terra, como saladas de broto de lentilha com beterraba, sanduíches de rúcula, alface e laranja, sopas de inhame, enroladinhos de folha de couve crua com arroz e beterraba e assim por diante. Descartáveis são terminantemente proibidos e palavras como “carne” e “coca-cola” podem desencadear olhares fulminantes e comentários de reprovação.





Dentre as únicas exceções ao estilo econatural, estavam as indispensáveis cervejas vendidas no bar, os walkie-talkies que permitiam as organizadores se comunicarem, e o gerador de luz que alimentava o pequeno palco onde se apresentaram grupos dos mais diversos estilos musicais, desde a quebradeira polifônica do Água Viva até o rap do Pino Solto, passando pelo forró do Cor do Sol, pelo rock descaralhado dos Fuzileiros Nasais e do Elepê, pelo reggae, pelo samba, pelo eletrônico e por tudo mais que viesse.





Se você me conhece um pouco, deve estar se perguntando como é que eu sobrevivi para contar história. E sou honesto: apesar de urbanóide convicto, admiro muito a postura do pessoal do festival, que consegue negar o estilo de vida imposto pela grande cidade e ir viver tranqüilo no mato, plantando sementes e colhendo os frutos da terra sem agredir o meio ambiente. Admiro, mas não é pra mim; talvez os dois dias que fiquei por lá representem o máximo de tempo que consigo agüentar sem chuveiro, pia e vaso sanitário – além das comidas nada ecologicamente corretas da cidade. Embora curta o contato com a natureza, um camarada urbano e citadino como eu precisa, pra início de conversa, de água encanada e um quartinho azulejado pra poder sobreviver.



18 comentários:

Cascarravias disse...

iTunes, na moral, nesses tempos loucos em que vivemos os haribo querendo reviver um movimento de quarenta anos de idade não vão chegar a lugar algum. teu parceiro ali já mandou a letra: geral agora tem que se unir aos The Trutas, o único e verdadeiro movimento foda pra caralho. se tiver menos de 25 anos de idade (cronológica ou mental, tanto faz) você se une aos The Trutinhas, braço jovem do movimento.

Cascarravias disse...

e mais uma: "esse pessoal que consegue negar o estilo de vida imposto..." para por aí achtung, por favor.

primeiro que não negam porra nenhuma. cada uma das informações a respeito de patcha mama e sei lá mais o que que se glorifica nesses lugares vem da internet; tu bem sabe que um moderno jovem de classe média urbana só pode acordar um dia e resolver se converter ao budismo ou à religião dos Nascar na exata medida em que é um 21st century digital boy. as receitas de capim com broto de samambaia vêm da mesma fonte.

sem o apêndice mundano que gera os recursos e as matérias primas que usam pra elaborar toda essa patifaria, não conseguiriam nem mesmo deixar de comer carne. nem tudo (aliás, muito pouco) do que usam pra elaborar seus utensílios e alimentos poderia ser plantado no quintal, aliás alguns nem mesmo nesse hemisfério. se não fosse algum não iluminado pela poeira cósmica pra trabalhar no velho esquema fordista e angariar algo do vil metal pra fornecer, neca de pitibiriba de festival harestock.

comem soja? que belo, a agroindustria da soja fode com o planeta mil vezes mais que minha vaquinha que um dia vai virar picanha.

aliás, os psicotrópicos consumidos pra se chegar a considerar essa vida bacana, vêm de onde? chegam como? são pagos de que forma? com amor e fraternidade?

foi mal, mas não me contenho diante de saudáveis filhos da geração danoninho que se cansaram do playstation e resolveram comer capim. sentados em seus buracos sanitários, mandam e-mails pro mundo todo divulgando seu encontro de consumidores de soja e lsd organico através de seus laptops... a conta, ah, a conta alguma alma pouco evoluída e com o kharma carregado paga.

Cascarravias disse...

eu acho que pra esse estilo de vida se tornar mais "sincero", deveria alterar sua auto definição de 'sustentável' pra 'sustentado'. não é só pelo fato de serem todos filhos da geração danoninho - pra que meia dúzia de filhos de shiva curtam a onda da salada de braquiara com a sola do pé em contato com patcha mama, é necessário que todo o resto da população manche sua áurea em contato com a matéria degradante; se todo mundo resolver dedicar sua vida à capinocultura, não vai ter alfafa o bastante pra todo mundo. fora o fato de que mesmo adotando o estilo de vida mais simples e estóico já imaginado, não se vive apenas com a ingestão de certo quantum de calorias organica e ecologicamente adquiridas.

mesmo os saddhus precisam de potinhos de esmola, incensario e charas pra se resignar a uma vida de meditação

Juliano disse...

Bom, pelo menos lá tinha cerveja. Se contra a AMBEV eles não têm nada contra, então merecem o meu respeito.

Anônimo disse...

E viva o capitalismo!

gigi disse...

Gente, eu vou abrir uma comunidade no orkut em honra e glória ao Cascarravias. Na boa. Genial. Ele sempre diz tudo o que quero dizer.

Cascarravias disse...

quanta gentileza! mas não deperdice esforços: crie uma comunidade em honra e glória dos The Trutas, um movimento ultra mega foda demais da conta.

Cascarravias disse...

feliz 11/09 pra voce e todo aquele que for da America do Norte

Unknown disse...

Breves comentários mordazes de um leitor desaparecido:

1 - Casca, assino embaixo em relação à soja;

2 - Prefiro mil vezes ter um filho haribo a um filho comunista - afinal de contas é melhor organizar seus ideais em torno de velhos preceitos de 40 anos atrás do q em relação a velhos preceitos do século XIX - além do q é melhor pensar em termos de "paz e amor" do q de "ódio e inveja", né não?;

3 - que mal há em ser alguém do "21st century", quando estamos no 21st century?


Galera, com todo respeito: não fui no Hariboostock, mas querer desqualificar a galera de lá por motivos tão vis... pensa q poderia todo mundo estar se esmagando em uma micareta por aí, como muitos outros da mesma classe social dos hares em questão.

É isso. Fui. Agora espero a porrada...

Cascarravias disse...

não fui ao harestock como nuca fui a uma micareta. tudo a mesma merda.

comunismo não é preconceito do século XIX, nem tampouco ódio e inveja. avante ó vítimas da fome, em pé famélicos da terra. alé do mais, metade das sandices harebos são contrabandeadas e distorcidas do comunismo.é pura vulgarização de um pensamento que pra mim já nasceu com predisposição para tanto - marcuse e foucault. 68 deu errado pq marcuse e freud ocuparam muito mais espaço nas cabeças estudantis do que marx. e não vou perder nem mais um segundo respondendo essa sua provocaçãozinha sórdida.

o mal está em ser digital boy.

Paulo Bono disse...

caro arthur,
passo longe desse lugar, meu velho. e outra: cerveja pode? bons naturebas.
grande abraço

Unknown disse...

Galera, vejam o Pino Solto no Festival:
http://www.youtube.com/watch?v=uA7UAsH5FVA

Cascarravias disse...

correção: em micareta nao tem pino solto. ponto pros hare hare.

Vivi disse...

Gigi, a comunidade acaba de ganhar mais um membro, euzinha!!!

Anônimo disse...

UGA-UGA!!

Jana disse...

os haribo(l)s me perderam quando deixaram de ser um docinho de açúcar inustrializado e vermelho por causa dos corantes para virar esse povo sem banheiro e que de vermelho, só come beterraba.

Unknown disse...

Queria clarear a mente dos que não foram que NÃO HAVIA SOJA NO EVENTO!!!

Não negamos a tecnologia, tanto que o nome do evento é Eletrorganico, mas sabemos que o desafio da comunidade do 21st century é conciliar os avanços da tecnologia com o equilíbrio e a Harmonia da Natureza.

Não porque devemos salvar o mundo. Não. Mas porque queremos salvar a nós mesmos.

Amor e Luz no seu Coração.

harebô!!

Tchello Melo disse...

Eu participei do festival e acho válida a idéia haribol, ainda que haja contradições. Mas em qual ideologia não há?