quarta-feira, junho 13, 2007

Sobre os palavrões

Alguém aí já reparou como a maioria das gírias, expressões e palavrões que utilizamos reproduz uma lógica machista e homofóbica de dominação? Michel Misse já. O sociólogo e professor do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ – local onde tive a oportunidade de assistir suas aulas sobre crime e violência urbana – publicou, há quase trinta anos, um livro chamado “O estigma do passivo sexual” (1979), onde desmascara a estigmatização de mulheres e homossexuais “passivos” que permeia várias gírias e expressões de uso cotidiano da língua portuguesa.



Pra usar um eufemismo, é “engraçado” perceber que, mesmo após a emancipação feminina, a revolução sexual e a consolidação de São Paulo como a capital gay do Brasil, a maior parte dos palavrões e gírias que Misse analisou continuam a ser amplamente usadas nos dias de hoje.




Tomemos, primeiramente, o exemplo mais básico: a palavra “homem”, quando usada em gíria, pode significar policial, aquele que domina e tem o poder. E se falta coragem, força ou disposição pra um menino fazer alguma coisa que os outros meninos fazem? É chamado de mulherzinha ou, em idade mais avançada, de viadinho.



E quando a polícia bate na população? Está “metendo o pau”, ou “descendo o cacete”. O órgão sexual masculino, aliás, quando não está associado a força e dominação, é invariavelmente ligado a atributos positivos – pois se algo é bom, é “do caralho” (o adjetivo “foda”, originalmente usado como sinônimo de coisa boa, hoje possui conotação dúbia, dependendo do contexto).



Já os órgãos ligados à passividade, ou seja, o cu e a buceta (pra usar português claro), estão sempre conectados a atributos pejorativos. Um cara idiota é um “babaca” (um dos nomes da vagina); um sujeito pobre ou miserável é um “coitado” (aquele que sofre o coito); para xingar alguém, mandamos “tomar no cu”; se a situação está ruim, é porque “fudeu” ou “deu merda” e assim por diante.



Existe, inclusive, um e-mail (desses que circula pela internê) que revela como a mesma palavra, dependendo do gênero, pode ter significados diferentes – mas sempre pejorativos no caso feminino.



Vejam como procede:


Cão....................... melhor amigo do homem
Cadela....................puta

Vagabundo.............homem que não trabalha
Vagabunda.............puta

Touro.....................homem forte
Vaca......................puta

Pistoleiro................homem que mata pessoas
Pistoleira................puta

Aventureiro.............homem que se arrisca, viajante, desbravador
Aventureira.............puta

Homem da vida..... pessoa com sabedoria
Mulher da vida...... puta

Garoto de rua........ menino que vive na rua
Garota de rua.........puta

O galinha................aquele que traça todas
A galinha ................puta

Tiozinho................. irmão mais novo do pai
Tiazinha.................. puta

Feiticeiro................ conhecedor de alquimias
Feiticeira................ puta

Puto........................ nervoso, irritado, bravo
Puta........................ puta.







Como vocês podem ver, os estigmas e preconceitos estão aí a dar com pau. É uma merda admitir que eu, como você, fico puto de perceber que muitos desses palavrões são introjetados sem que a gente se dê conta. E o que é pior, sem nem um KYzinho.




Bom, isso era o que eu tinha pra dizer. Quem quiser dar sua opinião, pode dar à vontade. Só não venha com essa história de politicamente correto, que isso é coisa de viado!




*





O livro “O estigma do passivo sexual” foi relançado pela Bookmarks em 2005. O prefácio escrito por Misse em 1978, bem como a introdução escrita por Peter Fry, podem ser lidos aqui.

27 comentários:

Diogo Lyra disse...

Ah, vai pra puta-que-pariu porra!!!
Palavrão de cu é rola seu merda, que se foda esse assunto babaca...

4rthur disse...

o bom e velho...

Cascarravias disse...

tchrons, na motal, as vezez eu tenho a ipresão que tu escolhe a dedo os assuntos pra ver o tipo de escrotice que eu vou falar. mas tudo bem

não gosto nem um pouco do autor citado pro debate - que aliás não teve nenhuma idéia muito original nesse trabalho. não sei se tu já leu Edmund Leach, mas ele tem um texto muito bm sobre isso. não me lembro a referencia correta agora, e meu livro esta eprestado, mas é um dos artigos do volume dele daquela série clássica da Ática.

segundo o nobre antropólogo, uma constante impreesionante que atravessa quase todas as culturas que ele tinha observado, era a estrutura geral dos palavrões em todas elas.

sinteticamente, as culturas reservam tres categorias gerais para os palavrões: a escatologia (escrementos, vísceras, secreções, correltaos sexuais); a blasfêmia (atentados ao sagrado, em que o castelhano é realmente muito criativo) e analogias animais.

Cascarravias disse...

só pra registrar, algumas das avaliações que vc deu como exemplo ali eu acho bem forçadas

4rthur disse...

são mesmo, não são?

de qq forma, é bom tê-lo de volta.

E tua coluna, morreu no número um, né? Ou vai ser semestral?

4rthur disse...

"tchrons, na motal, as vezez eu tenho a ipresão"?????

Que que foi isso, brother, mal de parkinson?

Unknown disse...

Quanto ódio no coração do jovem Casca...


Será q é um dos sintomas do parkinson? Sei não...

4rthur disse...

Pois é... e entre o mal de parkinson e o de alzheimer, sou mais esse último; afinal, melhor esquecer de pagar a conta do bar do que derramar a cerveja toda no chão.

Diogo Lyra disse...

Devo concordar, ainda que em parte, com as observações do bom e velho Casca. Quem leu o Leach - que a propósito Leo, está comigo - faz a boa ponte com o Misse, mas não deixa de observar a profundidade analítica do primeiro...
Bons trabalhos acadêmicos, para diferentes gostos.

gigi disse...

Pior que isso é notar que a larga maioria dos mancebos ainda leva o Bom e Velho dentro de si.

bêjo

Unknown disse...

Cara, eu não ia me manifestar sobre o assunto, até pq me falta a isenção necessária. Mas vá lá, cometerei esse erro:

o Leach é obviamente uma influência (referência, no jargão acadêmico) pro livro do Michel, mas a análise dele é diferente, e bem menos abrangente q a do Edmundinho. Ele fala não sobre palavrões em si, mas sobre o estigma (conotação negativa, e aí a outra gde referência é o Goffman, q, já adivinho, tb deve ser detestado pelo Casca)q palavras q indicam passividade sexual adquirem aqui no Brasil, no contexto específico nosso. Não q isso não ocorra em outros lugares, mas não rola uma gde generalização no texto. E assim, mesmo termos q não são palavrão, entram na análise, como os verbos "dar" e "abrir", e como sinal de prestígio vêm os termos q se referem a um papel ativo sexualmente, como "comer" ou "porrada" (q vem de esporrada, ou seja, é melhor esporrar - papel ativo- do que ser esporrado - papel passivo).
Acho o livro bem maneiro, mas é meio datado mesmo, até pela base teórica estruturalista... mas aí o papo já ta ficando chato demais...

Mas numa coisa me vejo obrigado a concordar com o Casca: o texto do Leach (acho q se chama algo como "categorias animais e insultos verbais") é muito foda mesmo. Um Crássico, com Cê maiúsculo.

Cascarravias disse...

é isso mesmo, o título é esse. e adivinhou, eu tb odeio goffman.

os erros de digitaçõ nõ indicam - pelo menos ainda - nenhuma degeneração. é só a falta de costume com as teclas do laptop

mas voltando a falar sério, ese é um bom exemplo de que minha pinimba nao tem a ver com os objetos dos estudos, mas a forma como o problema é formulado e tratado.

sobre a coluna, foi mal, mas esses comentarios esparsos sao o máximo de esforço de digitação dispersa que eu me permito atualmente

Cascarravias disse...

4rthur, te mandei um mail agora que voltou. tenta me contactar ao longo dia. dá tempo, ele só começou há meia hora

Vanessa Ornella disse...

Eu ganhei um KY de uma cliente outro dia. Uso muito pra enfiar termômetros no orifício retrofuricilar de meus pacientes, com camisinha de termômetro e tudo, que eu não sou besta.

Nem sei porque disse isso aqui. Vi a foto do KY e fiquei nostálgica de meus domicílios.

Não pense besteira.

dän disse...

interessante seu post... adorei! e hoje eu postei sobre "gírias antigas" rsrs... beijos!

blah disse...

Achei interessante a análise, mas confesso que boiei um pouco nos comentários academicistas, afinal não li porra nenhuma destes autores que vcs falaram...

(taí.. e "porra nenhuma".. qual seria a análise?) rsrsrsrs

Samantha Abreu disse...

tenho mais ódio de mim mesma quando percebo que falo todas essas coisas, sem dar-me conta do preconceito que uso contra mim mesma!
ai que ódio!

e sei que não vou conseguir parar de dizê-los. Sei disso.
;(

dän disse...

vim ver se tem novidades.
vou te linkar, sabe...rs.
adoro seu espaço, beijo.

Cascarravias disse...

relendo esse post, lembrei da antológica estréia do hoje pasteurizado João Gordo como vocalista da sua banda ratos de porão, há mais ou menos vinte e cinco anos atrás. o então torneiro mecânico sobe no palco e tasca: "só queria dizer tres coisinhas pra vocês - pau no cu de deus, pau no cu da globo e pau no cu do abc"

Anônimo disse...

porra, vc tá preguiçoso pra caralho...

Anônimo disse...

maldito johnny the fat, traidor do movimento!

Anônimo disse...

esse falso punk não está respeitando os sentimentos e angústias do João

Vivi disse...

Ai, tô deprimida com a condição feminina entre os palavrões...Convoco as mulheres para um revolução "da buceta" (ai, se mamãe descobre que escrevo essas coisas!)...por isso prefiro o xingamento "tomar no cu" que é o mais democrático, serve pra ambos gêneros...hehehe

Anônimo disse...

serve pra ambos os gêneros, mas continua sendo estigma da passividade sexual, afinal quem toma no cú é o passivo...

4rthur disse...

pois é, dificilmente um "vai meter essa piroca" seria considerado xingamento...

Cascarravias disse...

e o mais contemporaneo "descaralhou-se"...
outra evidencia?

Anônimo disse...

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