quinta-feira, novembro 01, 2007

Kant, o filósofo virgem

O alemão Immanuel Kant (1724-1804) prestou um grande serviço à filosofia de sua época, que era dominada por duas correntes distintas de pensamento: de um lado, racionalistas como o holandês Spinoza e o francês Descartes (aquele que pensa, logo existe) formavam a galera do continente, que via na consciência do homem a base de todo o conhecimento humano. Do outro, empiristas como o escocês Hume, o o inglês Locke e o irlandês Berkeley (que dizia que “ser é ser percebido”) fechavam com o bonde da ilha, apostando que as coisas só existem a partir do momento em que podem ser percebidas pelos sentidos humanos.


Pra resolver a pendenga filosófica, Kant desenvolveu um pensamento nem tanto ao mar nem tanto à terra, acreditando que os racionalistas atribuíam uma importância exagerada à razão, enquanto os empíricos eram parciais demais ao defender a experiência centrada nos sentidos. Ou seja: Kant concordava com os empíricos quanto ao fato de que devemos todos os nossos conhecimentos às impressões dos sentidos. Mas, puxando a sardinha pro lado dos racionalistas, dizia que nossa razão também contém pressupostos importantes para o modo como percebemos o mundo à nossa volta. Em nós mesmos, portanto, existem certas condições que determinam nossa concepção do mundo, mundo este que só pode resultar de uma representação que fazemos de todas as condições e determinações extrínsecas. Assim, Kant concorda com a idéia de Hume de que nunca saberemos como o mundo é “em si”, mas apenas como é “para mim” ou “para nós”.


Para Simmel, o conceito de individualidade adquire a sublimação intelectual mais elevada na filosofia de Kant. Isto porque situa na liberdade todo o valor moral do ser humano, valor este que depende da responsabilidade que temos perante nossos atos. Daí deriva a fórmula do imperativo categórico de Kant: “Age apenas segundo aquelas máximas através das quais possas, ao mesmo tempo, querer que elas se transformem numa lei geral”. Esta frase, sem dúvida a mais reproduzida do filósofo, expressa uma ordem e uma generalidade (por isto chamada de imperativo categórico) calcadas na busca pela igualdade dos homens.


Tais valores – igualdade, individualismo, liberdade – são basilares da cultura que surgiu na Europa do século XVIII, e encontraram em Kant o seu principal baluarte filosófico. Jostein Gaardner, em O Mundo de Sofia (um belo livro pra quem deseja iniciar-se na história da filosofia ocidental), acredita que, com Kant, termina “toda uma épica da história da filosofia”, já que o filósofo teria conseguido “encontrar uma saída para o impasse a que a filosofia tinha chegado através da briga entre racionalistas e empíricos”.


Se você está pensando algo do tipo “um cara como esse não deve ter sido normal; no mínimo, deve ter morrido virgem”, provavelmente está certo. O comportamento profundamente metódico do alemão faz o personagem de Jack Nicholson no filme Melhor Impossível parecer um adolescente revoltado. Kant passou seus 80 anos de vida sem sair de sua cidade natal, a pacata Königsberg (que hoje se chama Kaliningrado e pertence à Rússia). Acordava pontualmente às 5 da manhã e deitava-se às dez da noite; dizem que os vizinhos podiam acertar o relógio pela hora que percorria o bosque da cidade. Antes de dormir, ia para o quarto – cujas janelas ficavam fechadas o ano inteiro – e se enfiava na cama de barriga para cima. Puxava a ponta do cobertor por sobre o ombro direito, passava-a por trás das costas até o outro ombro e daí trazia-a até a altura do umbigo. Devidamente empacotado, embarcava no sono. Caso alguma necessidade o despertasse no meio da noite, uma corda presa entre a cama e o vaso sanitário lhe servia de guia para não tropeçar no escuro.


Mas e a vida sexual do cara, não é disso que queremos saber? Ora, basta dar uma olhada no livro A Vida Sexual de Immanuel Kant, escrito nos anos 40 pelo francês Jean-Baptiste Botul. Lá, descobrimos que Kant achava o sexo um desperdício de energia vital. Para ele, o sêmen, a saliva e o suor eram fluidos que, preservados, ativavam o metabolismo e tinham potencial rejuvenescedor. Expelidos, trariam fraqueza e envelhecimento precoce. Por isso, Kant caminhava bem devagar – para não transpirar – e condenava veementemente a masturbação.



Como se vê, é fácil supor que o cara morreu mesmo virgem – e o que é pior, nem uma bronha batia, já que considerava a atividade um desperdício de fluidos. Não duvido que, se todo o tempo que neguinho gasta por aí falando merda, pensando sacanagem e suando no calor brasileiro fosse empregado em investigações intelectuais, teríamos produzido incontáveis tratados filosóficos e criado a mais importante escola de pensamento do planeta.

19 comentários:

Cascarravias disse...

arthur, para com antropologismo militante. "filosofia ocidental" porra nenhuma: filosofia, ponto. 'filosofia' é o termo pra uma forma específica de pensar o mundo.

uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Vivi disse...

1) O cara se ocupa de escrever um livro sobre a vida sexual (inativa) de kant...parece coisa de revista Caras. Francês tem cada uma...
2) Pior que a teoria do desperdício faz sentindo quando a gente lê o final do seu texto.

Anônimo disse...

lamentavel a simples nota ao livro sobre a vida sexual de Kant.
Quanto a Kant, aconselho a leitura, para não ter que falar deste acontecimento filosófico por meio de comentadores espúrios, como Simmel, ou Jostein Gaardner. Mundo de sofia excelente livro?!?!?!?!

Paulo Bono disse...

Arthur, gostei do post, cara. Você escreve sobre Kant como se deveria conversar sobre filosofia. sempre gostei do lance de liberdade e responsabilidade. Bem, mas confesso uma coisa. Para criar os incontáveis tratados filosóficos, não conte comigo.

grande abraço, showman.

4rthur disse...

quanto à frase polêmica "O Mundo de Sofia (um belo livro pra quem deseja iniciar-se na história da filosofia ocidental)":

Casca, só falei "ocidental" porque o livro não contempla o pensamento de Budas e Confucios. Mas acho que você sabe disso e tá só de implicância mesmo.

Filósofo, vai tomar no seu cu pra lá. A vida sexual de Kant não merece mais que uma simples nota, O Mundo de Sofia é, sim, um BELO livro pra quem nunca leu nada de filosofia (até porque contextualiza historicamente pensadores de Demócrito a Darwin). Além disso, eu desaconselho veementemente a leitura dos originais de Kant. Ao invés disso, entre num site de pornografia e bata uma punheta.

E Simmel é foda.

Anônimo disse...

Wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen.

Anônimo disse...

E pensar que no berço da civilização ocidental e de todo o legado clássico surgiu a palavra orgia...Kant não sabia que os gregos trepavam, bebiam, suavam as túnicas pra ficarem sarados e ainda criaram a política, a retórica, o direito e a democracia?

Anônimo disse...

é isso aí. Prostituta também é cultura.

Samantha Abreu disse...

Arthur!
Isso, antes de mais nada, pra mim, foi uma aula de filosofia.
Adorei teu texto.
Mas não gostei de 'O mundo de Sofia', mas não por questões filosóficas, ok?! Não gostei porqu o acho pobre literariamente falando (e quem sou eu, não é?).

Mas adorei saber que devo preservar alguns fluidos. Pra começar, vou tentar preservar apenas o suor de academias e caminhadas. :D...

Beijos!

Henrique Santos Pakkatto disse...

Fluidos desperdiçados à parte acho a obra de Kant maçante. Crítica da razão pura e Crítica da razão prática no duro é como moer granito com os dentes.
Meu cérebro(cérebro?!)deve ter desperdiçado muitos fluidos importantes na adolescência mesmo, poque Kant só dá pra aturar em textos sobre ele e sua obra.
Hume, Bacon e meu preferido Spinoza são mais palatáveis.

Yara disse...

Caramba, nao sabia desse lado do Kant nao.. apesar de ser meio radical esse método dele viver, em termos faz sentido, quantos homens (e mulheres tbm) vivem em funcao de se satisfazer sexualmente e esquecem do intelecto, vivendo uma vida de ignorancia? Complicadoooo..
beijoks!!
>>Literatura Inside<<

gigi disse...

Gente, eu amo o Arthur. Ele tinha que ter um quadro no Fantástico. Alô, Bial, descubra esse menino!

Eu AMO o Kant. É isso. Eu sou kantiana até o cu d'alma.

O mundo de Sofia é fofo, sim. Nêgo fala muito. Ótimo livro pra um adolescente de 13 anos.

tinhamo.

4rthur disse...

é isso, preta. É quase um livro infantil. Li pela primeira vez há mais de cinco anos e me despertei para a filosofia. Isso, por si só, já é um grande mérito. E cito o livro aqui livremente porque isso é um blog, e não uma pomposa revista científica.

saudades!

Cascarravias disse...

arthur, buda e confúcio não é filosofia. platão e aristóteles (e o que veio depois, fazendo comentário às suas obras, de vinte e cinco séculos pra cá).

de kant, vale muito a pena "a metafísica dos costumes". dela se extrai o que talvgez seja a maior das contribuições de kant, o postulado ético que serve de base pra qualquer regime republicano (no sentido que atualmente se empresta ao termo na ciência política): só adotar comportamentos que sejam generalizáveis sem comprometer a ordem social. isso é genial. é o "fazer aos outros o que quer que te façam", sem depender de um barbudo onipotente que vai punir os casos desviantes.

a Gigi pra variar tá certa. o mundo de sofia é excelente pro público que de outra forma estaria lendo harry potter.

Cascarravias disse...

e simmel é mais ou menos.

Cascarravias disse...

eu já estou deveras impaciente com essa patacoada de pensamento oriental. não seja mais um nessa lista, ou a porra da comida russa vai ser feita na Rua das Marrecas mesmo.

Jana disse...

1996 não foi um bom ano para eu ganhar as obras de Gaardner. Não gostei do Mundo de Sofia (quando a Sofia aparecia com todo aquele "quem sou eu?" dela que me fazia pensar foda-se e pular para parte da Filosofia).Eu sei, eu sei, o cara queria contextualizar a vida da garotinha com a filosofia, história,tempo... mas sério, eu achei uma droga. Pensei que fosse antipatia gratuita minha, anos mais tarde ganhei O Dia do Curinga, e novamente, o cara falhou gloriosamente em prender meu interesse.

Dai que agora eu tenho a filosofia de vida "livros de Jostein Gaardner e filmes com Tom Hanks, apenas diga não"

Acho mais polêmico o debate do Banquete de Platão que a virgindade de Kant. O cara tinha 1,50m de altura, a caixa toráxica deformada, saúde frágil e debilitada,zilhares de manias, familia dominadora e religiosa. E ele sabia qual era o peso da estética, acho que ele dever ter falhado em suas investidadas amorosas e crescido com o discurso de que se ele trepasse iria morrer, ou se batesse uma bronha a mão ia ficar cabeluda e a piroca, cair.

Tá vendo a importância de um padrasto gente boa para a ordem do bom pegador?

Beijos.

Rackel disse...

Kra... o meu ex comentou uma vez, ha mtos anos atras, sobre essa historia de desperdicio de fluidos... ele ouviu de alguém, mas não sabia direito de quem tinha escutado essa 'pérola' (assim consideremos a teoria na época). Lembro q caímos na gargalhada juntos quando ele me contou isso...

Eu nunca ia imaginar q essa historia fosse coisa do Kant, sério mesmo!

P.s.: eu li o 'mundo de sofia' já bem velhinha, mas não deixei de me encantar com o livro... vc pode ler aos 12 anos, ou aos 20 q ele vai continuar sendo bom do mesmo jeito!

jerusacassal disse...

Nossa!! vc deveria focar no que interessa realmente sobre esse GRANDE FILOSOFO.Não consegue nem escrever um texto coerente e de informações realmente uteis. ¬¬'