terça-feira, julho 03, 2007

Sobre a "mercadorização" da vida moderna

Quando comecei a estudar sociologia, há relativamente pouco tempo – em 2003, pra ser exato –, o primeiro livro que caiu em minhas mãos (emprestado por Diana, uma de minhas amigas mais próximas) foi A Grande Transformação, de Karl Polanyi. E as teorias contidas no livro, a respeito da grande transformação que ocorreu na sociedade moderna do século XIX pra cá, também causaram uma grande transformação no meu modo de ver as coisas, pois que despertaram meu interesse neste fantástico (não achei adjetivo melhor) processo de preponderância dos valores econômicos sobre tudo mais que existe. Ou, pra ter mais a ver com o que pretendo dizer, da possibilidade de quantificação valorativa de tudo que existe.


O advento da sociedade de mercado abstrai as particularidades de todas as coisas, conferindo-lhes valores monetários – para Marx, o tal “valor de troca”. E Polanyi mostra como esta orientação mercadológica da sociedade burguesa, a primeira civilização a se basear em fundamentos econômicos, parte de um tripé fundamental, que é a quantificação valorativa do trabalho, da terra e da própria moeda, o dinheiro. Segundo ele, "a ampliação do mecanismo de mercado aos componentes da indústria - trabalho, terra e dinheiro - foi a conseqüência inevitável da introdução do sistema fabril numa sociedade comercial". Mas vejam o real significado destas três coisas para Polanyi:


"Trabalho é apenas um outro nome para a atividade humana que acompanha a própria vida que, por sua vez, não é produzida para a venda. Terra é apenas outro nome para a natureza, que não é produzida pelo homem. Finalmente, o dinheiro é apenas um símbolo do poder de compra e, como regra, ele não é produzido mas adquire vida através do mecanismo dos bancos e das finanças estatais".


Logo, Terra, Trabalho e Dinheiro não foram produzidos como mercadorias, mas apenas tratadas como se o fossem – e por isso, chamadas pelo autor de mercadorias fictícias (ou aparentes). E é esta transformação, ocorrida a partir da organização da economia através do mercado, que gera uma condição de subordinação dos homens ao capital e, consequentemente, um tipo alienado de sociabilidade, já que o nexo social entre os indivíduos, mediado pelo valor, exprime-se como uma “relação entre coisas” (nos termos do velho Marx).


Este é o tripé básico da “mercadorização” da vida moderna; todavia, conforme fui percebendo com o tempo, estamos tão mergulhados nesta realidade que não seria exagero afirmar que toda e qualquer coisa pode ser reduzida à lógica econômica. Até mesmo a própria vida, como vemos nos experimentos genéticos e na especulação do valor sobre remédios e tratamentos médicos, e também no ar que respiramos, como ocorre quando se estabelecem vendas de cotas de poluição para países mega-industrializados como nossos vizinhos ianques (um dos diversos assuntos levantados no excelente documentário canadense The Corporation).




E, é claro, não seria diferente com a cultura. As manifestações culturais e artísticas, as danças, rituais, os trabalhos artesanais, a subjetividade do homem como um todo, enfim, tudo pode ser economicamente mensurado pelo “espírito” capitalista de nossa sociedadezinha pueril. E quando a necessidade, real ou adquirida, de ter la plata no bolso emerge às vistas do homem, essa valoração mercadológica passa a assumir contornos nocivos, passa a se mostrar preponderante, passa a ditar as regras, orientar as práticas e influenciar as criações. Passa a objetivar a subjetividade.


Por isso, não devemos ficar surpresos quando vemos artesãos indígenas adaptando seus “produtos” de forma a “terem utilidade”, além de enfeitar a casa dos turistas compradores. Ou quando observamos que danças populares são formatadas em espetáculos para que as elites possam aplaudir de pé (após terem pago o ingresso, claro).


Sinal dos tempos: quanto mais submersos nesta lógica de mercado, mais difícil torna-se sequer notar o condicionamento econômico do qual até mesmo nossa subjetividade encontra-se refém.




* * *




(até que este seria um bom tema de doutorado... mas, sei lá, acho que vou banir esta idéia e fazer um MBA em marketing, que dá mais dinheiro...)




30 comentários:

Marcelo Holecram disse...

Deus Mercado !!!

Graças a Deus !!!

Diogo Lyra disse...

A boa e velha bibliografia da prova de mestrado não morre jamais. Comigo aconteceu o mesmo em relação ao "Sobrados e Mocambos" e também "Homens Livres na Ordem Escravocrata"...

Unknown disse...

Haha... comigo foi "O Processo Civilizador" e "A Representação do Eu na Vida Cotidiana"...

Vivi disse...

humm, será que todo esse processo de "quantificação valorativa de tudo" não se choca com a ética, e acaba por refletir na "mercadorização" do caráter?
Muito bacana seu texto, eu aprendo um bocado por esses posts...

4rthur disse...

Tem razão, Vivi. Meu caráter, por exemplo, de acordo com a última cotação do mercado afro-americano, tá valendo apenas 25 centavos de dólar. Mas eu faço por 20.

Anônimo disse...

e o curau, vale quanto nos EUA?!

Unknown disse...

e um munguzázin?

Vivi disse...

Arthur, seu comentário me deixou com uma sensação de que falei bobagem...

4rthur disse...

Vivi, como dizem por aí, "sê besta, sô!"

beijo.

Sos Unhas & Garras disse...

4rthur,
já tinha visitado seu blog, mas ainda não tinha te dado os parabéns pelo conteúdo.
Continue escrevendo!

Samantha Abreu disse...

mais uma coisa muito boa!

ah! vi o texto sobre Garcia Marquéz e seu "um ponto só". A-do-rei! Obrigada.

Teu blog me liberta, às vezes. Adoro ver tudo o que acontece por aqui...
beijos!

Cascarravias disse...

eu acho esse livro no mínimo fundamental. Quando perguntem ao Bezaca sobre críticas a esta obra, ele me disse "criticas? não, não conheço. mas posso indicar comentadores..."

Anônimo disse...

Casca, why did you find this book "no minimo fundamental?"
Once again, we have just seen the wiley Casca, give us one of his trademark, 3-fingered comments. 3-fingers you say? Yes, just place 3 fingers on your pc screen and you'll then see it completey blocks Casca's entire ANALysis of A GRANDE TRANSFORMACAO.That's "A Really Big Ass Change" translating for those of us from the American Carolinas.
Ok, some of us have thicker fingers but this worsens Casca's predicament even more...
Casca, you know why I don't like you? You ain't REAL, man. I could care less about your beliefs and opinions. All these Cariocas on here tolerate your lame ass because they have mastered the sacred virtue of PITY. I however, come from a land where we do not tolerate PITY.

Arthur man, I am laughing and you know the reason why. After scrolling down the comments section, she appeared. You're an alchemist, man. You're trying to brew the most toxic "menage a trois" possible. I hope you know what you're doing... well if you do then there could be some very entertaining reads for everyone in the near future!

As for my opinion of the book. Well, I have never read it so have no REAL opinion about it. "The Corporation" is next on my list of films to view though. Will let you know what I think when I do.
Ever think about the word, CORPORATION? What is it? Why does it have so much power over us? It's not even human for christ sake's. Yes, man created it but now look how the corporation has become. Frankenstein? Terminator? They say corporations are the ultimate "machines".
Anyway dude, I don't want to dwell too much on this subject. Gives me the jitters. Well even Frankenstein and Terminator had their more tender moments.

I'll comment s'more about what you have written later on...

Unknown disse...

Casca, por acaso vc está comendo esse gringo?

Cascarravias disse...

eh isso mesmo? esse gringo tah me cobrando a opiniao de um livro que `na verdade ele nao leu`? se tivesse lido talvez soubesse pq eh obrigatorio. idiota.

arthur, to comecando a aderir `a teoria de que o gringo na verdade eh vc.

4rthur disse...

Porra, Casca, tu me pegou! Maldito Bruno, que revelou todos os meus planos.


Maria Paula? Isso é, sem dúvida, inusitado! Gostei da surpresa, apareça mais vezes.


Samantha, como diz a bandeira da terra da Vivi e do Casca, "libertas que será também" (é isso, certo?)

Garrett, go watch The Corporation right away. It'll blow your mind.

Vivi disse...

hahahaha "Libertas quae sera tamen", significa "Liberdade ainda que tardia", Arthur... E foi tirada da primeira Égloga de Virgílio pelo poeta e inconfidente Inácio José de Alvarenga Peixoto, nascido no RJ, vê se pode...

Cascarravias disse...

o gringo eh o arthur se fazendo passar por um adolescente de dezesseis anos

Unknown disse...

esse maluco é muito gringo mesmo (gringo aqui, na segunda "ressignificação" proposta, como otário mesmo, mané), acreditou na tal da primeira ressignificação ("hansome fuckass from Bushland"), feita por um viado, e tomou aquilo como uma grande vantagem... bom, pra quem gosta de homem, pode realmente ser verdade. O q não deixa de fazer dele um gringo (2a ressignificação, por favor) q faz sucesso no meio gay carioca. ô, se deu bem o gringo hein... por isso tava sempre sorrindo com cara de babaca, como ele mesmo diz.

Te apóio nessa Casca, essa personalidade adolescente do arthur ta passando dos limites, temos q fazer alguma coisa!

4rthur disse...

personalidade adolescente?

Eu axu q vcs taum eh viajanduuu...


AuHOhauoOAhUhHOAuh!!!

:oD

gigi disse...

Gente, os posts são ótimos, mas faz tempo que venho aqui pra ler os comentários.

Turos, hj é tu e eu?

bj

Let's disse...

hum, interessante blog! só passei pra conhecer... voltarei!
bjus!

Jota disse...

"Processo de preponderância dos valores econômicos sobre tudo mais que existe."

"Triste", seria o adjetivo que eu escolheria pra qualificar tal processo...

Anônimo disse...

Oh man, I really like this NOBRU guy. I could feel him trying to smash at me. Except old Nobru here doesn't quite "get it". Nobru my man, grab a dooby and light up! What many don't realize is that I am actually Casca's best friend.
What friend won't teach his pal the most valuable of life's lessons? What friend won't teach his bud to always be valiant in front of one's enemies? What friend wouldn't offer his brotha good career advice? What friend wouldn't show his chum scars from past lessons harshly learned? Most of all gente, what friend wouldn't try to get his amigo laid????
'nuff said about my best friend, Casca for now...

Dude Arthur, I am actually watching my tv again. It's the 4th of July, man and I just had to see IT. TV celebrations for america's independence day. The kind of TV programming I am witnessing this very moment would make Joseph Goebbles wet his pants with facist envy. Christ they even got Little Richard to perform in DC. Tony Danza is hosting...yeah I am stoned so this is too fuckin' wayyyyyyyyy out for me. It's like Faustao goin' on for hours. I'm being serious, it's just like Faustao. Shit Arthur man, you gotta see this shit!
I think this is what "A Real Big Ass Change" is talkin' about, though. I see the connection. Fuck, shit, god damn... I am seeing too many connections. The next guy is some caipira. They had to "white it up" after Little Richard.
The message I am feeling off of this programming is ".... the troops are over there doin' a good thing. A patriotic thing! May even be confusing to some of you jesus lovin' over-weight wal-mart shoppers but trust US, it's all a good thing. Everything is OK. For god's sake don't panic. Stop looking at that little soft spoken old man over there standing in the corner. He's not really pulling back that curtain to reveal to everyone who the Wizard of Oz really is he???? My god! That Ron Paul is the Wizard of Fuckin' Oz!..."
See man, the Wizard of Oz was like the Matrix of it's day. 1930's radicals in Hollywood figured out a way to show dumb america how it all really works.
Now all of the firworks are going off? What is the symphony playing??? Tchaikovsky's "1812 Overture". What the fuck does it have to do with July 4, 1776??? Russia defeated Napoleon and because of this New World Order won he War of Supremacy over Europe.
Ok that was just a feeble stoned out attempt at trying to fathom the absurdities I am seeing on TV...

Anônimo disse...

I want you, boy!

4rthur disse...

As celebrações pelo 4 de julho nos EUA estão entre as coisas mais repugnantes que alguém pode assistir. O engraçado é que esse feriado, tradicionalmente comemorado com alegria por todos os patriotas estadunidenses, com direito a mesas regadas de comidas - um verdadeiro "feast" só comparado talvez ao Natal e ao Thanksgiving Day -, se tornou motivo de grande apreensão, haja vista a paranóia generalizda que se instaurou na gringolândia desde os ataques de 11 de setembro.

Diogo Lyra disse...

"Thanksgiving Day"

(...)

"Dia de Ação de Graças"

Cascarravias disse...

eu fico pensando com meus botões... se esses adolescentes podem fazer esse tipo de sandice num computador, o que não fariam com metralhadoras em suas escolas?

blah disse...

Casca e Garret: Tem uma respostinha pra vcs dois no último post.

Arthur: Parabéns mesmo pelos últimos textos, eu aprendo muito com vc, meu camarada. Seu blog é tudo de bom!
Quanto aos recentes comentários anônimos te zoando no último post... Fico intrigado... Será que é o "filho" ou algum amiguinho dele daquela turminha do "demônio-cratas"???
Arthur, me apresenta a gigi??

gigi: Eu li sobre sua pesquisa há uns dois posts. Bem, gostaria de participar... E te garanto, posso não ser nenhum Gianeccini, mas também não sou barango.

Nobru: O Garret existe e REAL.

Anônimo disse...

I`m real, but sometimes I feel so lonely... Any large black cock here for me?